UM SUPERMERCADO NO NORDESTE: ensaio sobre
certa poesia contemporânea
O
título deste texto deriva de dois poemas que não têm exatamente relação entre
eles, ao menos nenhuma que eu tenha percebido ou possa justificar com segurança
(nada de citação ou de referência de um ao outro, por exemplo) – de modo que
talvez seja justo afirmar que se trata aqui de uma relação que eu inventei e
que tem a ver com a minha experiência de leitura e com a forma como os poemas
que lemos, mesmo aqueles aos quais aparentemente não damos muita atenção, nos
quais não nos demoramos tanto (é o caso de um deles, ao qual chegarei primeiro),
ecoam e retornam por meio de escolhas vocabulares, de temas, de sons, de
metros, de ritmos e também de imagens. Neste caso, o que me fez ir de um a
outro foram as imagens de um supermercado e de um hipermercado – que são as
imagens ou os locais a partir dos quais se organizam os dois poemas em questão.
Este
título, “Um supermercado no Nordeste”, emula e modifica “Um supermercado na
Califórnia”, famoso poema de Allen Ginsberg escrito em 1955. O Nordeste, no
caso, se deve à intromissão de um poema chamado “História”, de Allan Jonnes,
poeta sergipano que publicou seu livro de estreia em 2021 – um livro cujo
repertório de imagens (em geral, imagens noturnas e nordestinas, imagens
captadas como que por um motorista de aplicativo que vaga por uma cidade da
região durante a madrugada, vendo e anotando – ou filmando – aquilo que vê), enfim,
um livro cujo repertório de imagens se inicia com a descrição de um
hipermercado em chamas, que vai se consumindo no fogo e sendo saqueado pelos
consumidores que se transformam em ladrões ocasionais.
No
poema de Ginsberg não há nada disso. Nele, o autor estadunidense descreve uma
série de cenas um tanto oníricas, nas quais um poeta caminha pelos corredores
do supermercado e vê outros poetas, que no caso são dois poetas mortos (o
também estadunidense Walt Whitman e o espanhol Federico García Lorca) remexendo
no refrigerador de carne ou perdidos no meio das melancias. Além dessa intrusão
um tanto delirante, fantasmagórica, o poeta observa as famílias (“Corredores cheios de maridos! Esposas
entre os abacates, bebês nos tomates!”, ele descreve), é perseguido pelo
segurança da loja, pergunta-se pelo preço das bananas etc. – empreendendo assim
o que define como uma “odisseia no supermercado”, realizando aquilo que chama,
na tradução de Claudio Willer, de “shopping das imagens”, uma compra de
imagens que se dá por meio da enumeração ou da acumulação, dois expedientes
retóricos muito caros à poesia de Whitman (e aos próprios textos caudalosos de
Ginsberg), que é a figura central da obra, com a qual o poeta beat quer
dialogar. Não se pode dizer que o poema de Ginsberg seja um poema pacífico ou
conformado ao andar mecânico e consumista entre os corredores e prateleiras do
supermercado, já que muitas das suas descrições são nitidamente marcadas pela
ironia (sustentada por uma provocante dissidência de ordem sexual) voltada
contra a vida pacífica e conformada do que seria uma família estadunidense
funcional em 1955. O confronto entre Ginsberg e a imagem do supermercado,
portanto, é muito mais insidioso e ambíguo, talvez amparado em métodos de
enfrentamento menos radicais: fazer o shopping das imagens,
afinal, é ainda fazer o shopping – traço comum de uma arte cujos
diálogos com a sociedade do consumo e com a imagem publicitária se arriscavam a
serem confundidos com adesão, embora procurassem promover uma oposição crítica.
Se Ginsberg aposta na seriação, na enumeração ou
na acumulação, típicas de Walt Whitman, é também porque esses expedientes podem
ser adequados para a reprodução poética (e crítica, eu diria, ao menos neste
caso) da ideia de consumo de massa e em série, que ele procura descrever desde
os corredores e dos carrinhos do supermercado cheios de produtos das mais
variadas origens, cores e utilidades (muito embora essa variação seja limitada
pela forma como as cadeias de produção e de consumo se estabelecem e se
desenvolvem, a saber, reduzindo tanto a origem quanto a oferta de verdadeiras
variedades, padronizando os produtos). Já se afastando de Ginsberg, vale ainda
se atentar para o fato de que o shopping da imagens se passa e se faz na
Califórnia, pedaço particularmente endinheirado de um país cuja hegemonia, no
canto capitalista do planeta, após a Segunda Guerra, passava a ser
inquestionável e incontornável: o shopping das imagens se dava no topo
do que se chamava – e se chama, ainda – mundo desenvolvido.
O supermercado que realmente interessa a esse
texto, no entanto, fica longe da Califórnia – está, mais precisamente, em
Aracaju, de onde escreve Allan Jonnes (nascido em 1990, na cidade de Lagarto,
interior de Sergipe). Essa transposição abrupta de espaço guarda também uma
transposição abrupta de tempo – já que se salta da década de 1950 para as
primeiras décadas do século XXI. No entanto, há que se demorar um pouco mais na
década em que Ginsberg passeia pelo supermercado na California, mas deslocando
o olhar para o Nordeste: é em meados de 1950 que Celso Furtado expõe os seus
estudos e reflexões sobre o tema e procura pôr em prática – através do
convencimento das forças políticas de então – um processo de desenvolvimento
para o Nordeste brasileiro; em seu texto “Uma política de desenvolvimento
econômico para o Nordeste”, Furtado aponta para um fato que interessa aqui:
usando dados de 1956 (lembre-se que o poema de Ginsberg é de 1955), o
economista paraibano escreve que
o Nordeste brasileiro constitui a mais extensa área de baixo
nível de desenvolvimento do continente americano. Com renda per capita
similar, encontram-se, na América do Sul, a Bolívia e o Paraguai; na América
Central, Honduras, e, no Caribe, o Haiti. Entretanto, a significação do
Nordeste, no quadro do subdesenvolvimento latino-americano, salta à vista se se
tem em conta que a população de todos esses países, considerada em conjunto,
não alcança metade da nordestina.
Ou seja: na década de 1950, havia a Califórnia no
topo do mundo desenvolvido e o Nordeste no fundo do poço do subdesenvolvimento
do continente – e, muito embora o poema de Jonnes só vá ser feito sete décadas
depois, ele não passa (nem ele e nem todo o livro do poeta sergipano) ao largo
de sete décadas que foram também sete décadas de interpretações, aplicações,
críticas, interrupções e desvios de inúmeras políticas de desenvolvimento
econômico para o Nordeste[2].
Do supermercado californiano de Allen Ginsberg ao hipermercado nordestino de
Allan Jonnes a poesia cruza, margeia, ultrapassa e é ultrapassada pela história
do desenvolvimento do capitalismo neste canto – ora esquecido, ora lembrado –
do planeta.
Pode-se dizer que se Ginsberg fazia o shopping
das imagens, Allan Jonnes faz o saque das imagens. No poema do autor
sergipano também existe uma espécie de enumeração e acumulação textual e
imagética (na qual o poeta inclusive se refere diretamente às marcas dos
produtos, mencionando os sorvetes häagen-daz e as gilletes
prestobarba), mas nela a enumeração e a acumulação do consumo se dissipam
na situação caótica de um incêndio seguido por inúmeros e incontroláveis saques
– em meio aos quais surge a figura um tanto patética de um gerente armado com
um revólver e ao mesmo tempo impotente para conter o fluxo da história que se
desenrola diante dos olhos de um casal de namorados (que vê a história como uma
peça de entretenimento). Algo a se indagar, neste ponto, seria o seguinte: por
que o supermercado de Ginsberg (localizado num tempo e espaço em que o
capitalismo estadunidense vivia seu pleno desenvolvimento – isso, é claro, para
um certo setor da sua população, já que esses altos índices de desenvolvimento
econômico conviviam e, em certa medida, dependiam da exclusão de outros setores
do seu usufruto, uma exclusão sobretudo racial, e também classista, sexista, xenófoba
etc.) – enfim, por que o supermercado de Ginsberg inspira um moderado shopping
das imagens enquanto que o hipermercado de Jonnes surge por meio de um
saque generalizado das imagens e da destruição final, através do fogo, do
próprio estabelecimento?
Os esforços de Celso Furtado, organizados
sobretudo na SUDENE (a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste),
certamente estão distantes do horizonte que conforma a poesia de Allan Jonnes
(e de outros poetas contemporâneos da região), mas a questão nordestina
(ou, para usar um termo de André Singer – que por sua vez está adaptando uma
expressão de Gramsci – a questão setentrional) e tudo o que ela guarda
de debates em torno de noções como desenvolvimento e subdesenvolvimento,
progresso e atraso, política nacional e política regional, modernidade e arcaísmo,
nacionalismo e regionalismo – enfim, toda essa questão, a meu ver, irrompe de
forma radical e inovadora na poesia nordestina recente a partir das profundas
repercussões na vida social da região que foram promovidas por determinado
conjunto de políticas implantadas pelo Partido dos Trabalhadores desde o centro
do poder federal – conjunto de políticas ao qual se convencionou chamar de lulismo,
cuja crise e cujo revés a partir do golpe de 2016, aos quais se seguiu a
emergência de uma extrema-direita no país, também alteraram significativamente
as leituras dos seus erros e acertos, dos seus potenciais e limitações etc.
Hoje, mais de vinte anos após a primeira vitória
eleitoral de Luis Inácio Lula da Silva, há uma enorme quantidade de
bibliografia a respeito do tema, o que deixa evidente que o lulismo é
uma questão que segue candente na sociedade brasileira, norteando disputas
eleitorais, organizações de movimentos sociais e interpretações a respeito de
fenômenos recentes da história do país e suas relações com o contexto
latino-americano e mesmo global (ou seja: o esgotamento ou a crise não
significaram necessariamente o encerramento). Não é o caso de oferecer aqui uma
visão nova ou uma interpretação ampla das políticas lulistas (tarefa para a
qual sequer tenho competência: eu dificilmente passaria de uma recolha de
impressões e experiências pessoais de alguém que viu e viveu, de fato,
transformações significativas na região), mas de partir dos inúmeros dados e
leituras do fenômeno e tentar entender o modo como as transformações radicais
da vida social (e, por tabela, também da vida cultural) promovidas pelo lulismo
repercutiram na poesia de um jovem autor formado no meio mesmo do processo – e
cujo livro aparece, em 2021, durante a vigência de um Estado comandado por um
grupo de extrema-direita que se pauta sobretudo numa reação às políticas
sociais lulistas. Acho importante, neste ponto, salientar que este é um tema de
pesquisa que está para além da poesia de Allan Jonnes e que julgo ser discernível
e analisável na obra de outros autores da mesma geração, alguns mais velhos,
outros mais novos, dos mais diversos estados da região – aqui, por conta do
tempo e do estágio inicial da reflexão e da pesquisa, devo me concentrar em
apenas um deles, mas poderia listar, a título de ilustração, nomes como os dos
baianos Ederval Fernandes e Maria Dolores Rodriguez, do alagoano Lucas
Litrento, da sergipana Luis Matheus Brito, dos natalenses Pedro Lucas Bezerra e
Maíra Dal’Maz (poeta nascida no Pará), do cearense Diego Vinhas, do
pernambucano Phillipe Wollney e outros mais (e a junção desses nomes não
significa que se tratem de poéticas semelhantes ou que encarem o fenômeno sob a
mesma perspectiva, mas indica, ao contrário, a diversidade de formas
encontradas pelos autores da região para lidar com essa experiência, bem como a
consciência desses autores de que escrever poesia no Nordeste, hoje, é também
lidar com essa experiência).
André Singer, em seu livro Os sentidos do lulismo,
aponta para a centralidade da questão setentrional no desenvolvimento e na
consolidação do lulismo como uma tendência política de longo prazo, que
promoveu o realinhamento eleitoral (nem tanto ideológico) de frações de classe
(sobretudo o subproletariado) concentradas principalmente no Nordeste,
alterando um ordenamento tradicional da estruturação do capitalismo brasileiro
– ordenamento descrito por Singer como um “estranho arranjo político em que os
excluídos sustentavam a exclusão”. Segundo Singer, o lulismo toca nessa questão
ao tocar na pobreza: “O Norte e o Nordeste têm índices de pobreza bem maiores
que os do Sul e do Sudeste. O populoso Nordeste, em particular, é o principal
irradiador de imigrantes para as regiões mais prósperas. Por isso, entendo que,
ao tocar na questão da miséria, dinamizando, sobretudo, a economia nordestina,
o lulismo mexe com a nossa ‘questão setentrional’ (...)”. A redução da
irradiação de imigrantes trabalhadores e a dinamização da economia e do mercado
interno do Nordeste, com a criação de postos de trabalhos, a ampliação de uma
relativa segurança econômica, o aumento de vagas nas universidades, o acesso a
bens de consumo básicos – tudo isso promove uma reorganização da vida social e
econômica da região, refletindo-se, obviamente, no campo cultural.
No caso da literatura e da poesia, creio ter
havido uma alteração inclusive no âmbito da sua produção – quer dizer: creio
que a poesia (e me refiro aqui àquela poesia tradicionalmente associada ao
campo estritamente literário, a saber, uma poesia escrita a partir da ideia de
uma língua nacional, lida desde determinada divisão de gêneros literários,
veiculada através de impressos, sobretudo de livros etc.), enfim, creio que
essa poesia, historicamente associada aos extratos sociais letrados (o que, no
Brasil, significou quase sempre extratos sociais burgueses e pequeno burgueses),
passa a ser produzida predominantemente por autores oriundos das classes médias
menos assentadas e também das classes proletárias e subproletárias. Parece ter
havido, afinal, a consolidação de uma tendência que já fora apontada, no âmbito
latino-americano, por Roberto Bolaño – que, ao responder à pergunta sobre de
onde vinha a nova literatura latino-americana, afirmou:
A
gente vem da classe média ou de um proletariado mais ou menos assentado ou de famílias
de narcotraficantes de segundo escalão que já não querem tiroteios, mas
respeitabilidade. (...) antes os escritores vinham da classe alta ou da
aristocracia e ao optar pela literatura optavam, ao menos durante um tempo que
podia durar toda a vida ou quatro ou cinco anos, pelo escândalo social, pela
destruição dos valores aprendidos, pela galhofa e pela crítica permanentes.
Agora, ao contrário, sobretudo na América Latina, os escritores saem da classe
média baixa ou das fileiras dos proletariado e o que desejam, ao fim da
jornada, é um pequeno verniz de respeitabilidade.
Uma alteração dessa magnitude não pode se dar sem
que se alterem tanto o ofício da escrita quanto as suas formas, já que o
surgimento e a consolidação dessa nova autoria implicam também na modificação
do que seria um público leitor e a emergência de um novo campo editorial e
crítico (bem como, no caso recente e brasileiro, universitário)[6]. O
próprio Allan Jonnes, por exemplo, é um autor bastante ligado à poesia oral,
seja no formato do slam e da canção, seja nos formatos mais associados às
tradições regionais do Nordeste como o repente e o aboio – é comum, por
exemplo, que o poeta se refira ao seu avô, justamente alguém que fazia aboio,
como o ponto inicial do seu contato com a poesia. Areia para engrenagens
é um livro nitidamente marcado pela experiência da criação e da expressão
poética oral, algo discernível na utilização constante de reiterações e repetições
(um tradicional método para ligar memória e língua). A acumulação e a seriação –
fundamentadas na repetição de estruturas de base para o acúmulo – aparecem em
poemas centrais do livro como “Não há rituais para os que furtam”, “Códigos
sublimes” e “Para o Maguila com carinho”.
As relações que a poesia de Jonnes e muitos dos
seus parceiros de geração propõem com as produções artísticas mais associadas à
“cultura popular”, no entanto, estão longe de configurar um campo pacífico e
harmonioso, por onde se passa tranquilamente em busca de soluções para
revitalizar ou popularizar a poesia. Sendo o Nordeste um território sobretudo
da canção popular, bem como das grandes festas de rua, a adesão destas à
indústria cultural não passa despercebida, sendo muitas vezes explorada de
forma crítica e irônica pelos poetas. Nos seus momentos de maior interesse e
novidade, a recente poesia nordestina parece operar a partir de uma noção muito
bem descrita por Beatriz Sarlo como um “olhar político”, aquele que “não
transforma a cultura popular em tópico de um conservadorismo estético mais ou
menos nostálgico” (em seus momentos de menor alcance e interesse, como na
poesia de Bráulio Bessa, a proposição é o exato oposto disso) e sabe que “a
cultura popular não é um tranquilo espaço homogêneo, mas antes um campo de
tensões e de tendências que definem momentos revulsivos com relação aos ‘bons
costumes letrados’ e também momentos reacionários do ponto de vista do seu
próprio regime estético-ideológico”[7].
Assim, a poesia de um autor como Lucas Litrento, por exemplo, vai ao rap para
atacar os bons costumes letrados (neste caso, os bons costumes letrados
mantidos sobretudo por uma tradição racista) numa aposta que o leva também ao
jazz e chega ainda ao repente: “john coltrane, um repentista/ faço rap – eu
digo à mulher/ mal sabe que nunca consegui/ rimar cifras estrangeiras/ mas nada
disso importa// porque eu canto/ eu finjo que sou lírico”; mas também vai ao
espaço da canção popular da região para identificar os limites padronizados do
seu atual regime estético-ideológico: “são todos iguais no paulista/ tomando a
mesma cerveja/ fumando a mesma maconha/ cantando a mesma música de duda beat/
em loop”. A captura da cultura
popular – que gera um padrão industrial, muito caro às classes médias[8],
que passa a ser confundido com expressão genuína de um desejo estético do
“povo” ou das “classes populares” (esses problemas conceituais) aparece também
na poesia de Phillipe Wollney, como se nota pela sua descrição do carnaval contemporâneo
como um espaço de simulação de soluções para uma luta de classes travada na
região: "(...) car/ na/ val/ mais/ do/ mesmo/// fan/ ta/ si/ as/ de/ o/
pe/ rá/ ri/ o/ &/ pa/ tr/ ão (...)"[9].
Mas retorno a Singer, que, ainda no mesmo estudo citado
anteriormente, define o lulismo como uma “adoção de políticas para reduzir a
pobreza – com destaque para o combate à miséria – e para a ativação do mercado
interno, sem confronto com o capital”. Essa tendência a evitar um
confronto com o capital, em se esquivar da radicalização do discurso de classe
é um dos fundamentos para a análise de Singer, que observa o lulismo a partir
dessa tentativa de conciliação (palavra que terminou por ressoar mais
fortemente no senso comum do pensamento crítico de esquerda brasileiro). Singer
usa o termo reformismo fraco para definir o lulismo, e afirma: “Meu
argumento é que o reformismo lulista é lento e desmobilizador, mas é
reformismo” – e o final dessa sentença me parece lapidar, já que é elaborado a
partir de uma compensação: o reformismo lulista é fraco, lento, desmobilizador
mas, ainda assim, é reformismo, ou seja, ainda assim é um acontecimento
político e social único e sem precedentes num país formado por uma massa de
miseráveis historicamente excluída de qualquer participação em qualquer
nível – mesmo o mais precário – de cidadania, para usar o termo (massa de
miseráveis) que o próprio Singer utiliza ao refletir sobre como essa questão
(a questão de uma massa subproletária
herdada do sistema colonial e escravista) aparece nas obras de Celso Furtado e
Caio Prado Jr.
Esse expediente compensatório, na poesia colocada
em questão aqui, é recorrente e costuma aparecer em imagens um tanto
dilaceradas, divididas entre o reconhecimento do inegável progresso (essa
palavra perigosa) que significa o acesso a bens de consumo básicos – até então
inalcançáveis – e a crítica à limitação desse modelo de progresso (talvez não
tão lento, mas certamente desmobilizador). Num poema de Philippe Wollney, por
exemplo, do seu livro Caosnavial, de 2016, lemos o seguinte: “contratos:
pedidos de liberação de crédito/ tratados: resoluções: acordos econômicos/ : o
sonho da casa própria/ : o carro do ano/ : a comida sobre a mesa: a sede de
viver/: & um desejo: agora/ em tom de zinco” – note que o poeta vai a um
aspecto central do desenvolvimento econômico sob o lulismo, o crédito, e
elenca em seguida seus frutos: a casa própria, o carro do ano, a comida sobre a
mesa – desviando-se, ao fim, para um outro campo, referindo-se à sede de viver
e ao desejo, que certamente não dizem respeito ao consumo, mas que podem passar
também por ele, sobretudo para aqueles excluídos dos seus circuitos. Tudo isso aparece
num livro publicado em 2016, o Caosnavial, em que o que se destaca são
paisagens deterioradas de uma cidade do interior que se urbaniza a passos
lentos e violentos, compondo-se de uma variedade de tecnologias de ponta e
sucatas, centros e periferias, violência e sexo, luta de classes e massacres
policiais – tudo isso vazado em versos ou numa prosa poética descrita pelo
próprio autor, no primeiro poema do livro, como “manifestação de língua
nordestinada : pernambucanalha de fala arrastada quase cantada”. Essa
referência à língua – uma língua distinta da portuguesa brasileira, talvez? –,
que abre o livro de Wollney, é indicativa também de certa tendência que estes
autores aos quais me referi (como o próprio Jonnes, ou o baiano Ederval
Fernandes) têm de trazer ao primeiro plano os dialetos locais, compondo os
poemas recorrendo a gírias, ritmos e vocabulários bastante específicos, pondo
sob questão o português brasileiro como uma língua franca da poesia feita em
território nacional[10].
Contudo, voltemos às imagens divididas já
identificadas na tese de Singer sobre o lulismo e na poesia de Wollney,
pois elas aparecem também em diversos poemas de Allan Jonnes, como é o caso de
“Abrir com as mãos uma cidade”. Neste poema, os hipermercados não estão na
paisagem – mas o poeta faz o registro de uma longa noite em Aracaju, atento aos
seus trabalhadores precarizados (roadies, enfermeiros, operadores de
telemarketing, motoristas, recepcionistas de motel), à violência policial, ao
consumo de drogas tornado questão social, à prostituição e à violência sexual contra
crianças, ao turismo predatório etc. A certa altura do poema, se dirige diretamente
aos cidadãos: “abrir com as mãos uma cidade/ sacudir seus citadinos pelas
golas:// infelizes piedosos/ e este modo de salvar/ que não emancipa” – e essa salvação
sem emancipação é que é fundamental para o que aqui procuro debater. Uma
lógica semelhante, adequada ao debate, foi identificada e dissecada por Milton
Santos ao criticar a ideia de uma ascensão social pela via do consumo nos
países periféricos, chamando atenção para o fato de que o consumo é pautado por
aqueles que controlam a produção e portanto está longe de qualquer coisa como
uma livre-escolha ou de uma emancipação; segundo o geógrafo baiano, este era o
dilema: “ou perpetuamos esse modo de consumo e ajudamos os gigantes da
indústria e do comércio, que de forma tão frequente são considerados
‘opressores’, ou, a fim de eliminar sua dominação, advogamos a causa da mudança
nos objetivos da produção, isto é, da própria estrutura de produção”.
Essa salvação sem emancipação (ou talvez
essa entrada na esfera do consumo sem alteração nos modos de produção), como se
nota no poema, é oferecida pelos “citadinos” (aqueles que ocupam uma posição um
tanto rara na sociedade brasileira, uma posição de cidadania), certamente
bem-intencionados, e que são também aqueles para quem se dirige esses outros
dois versos fundamentais: “essa república acabou antes de ontem/ apenas para
nós que somos cândidos” – são citadinos, portanto, marcados por certa
ingenuidade, alheia às violentas formas de vida noturna da cidade, que se
desenrola à revelia de qualquer ideia de cidadania. Afirmar que a república
acabou antes de ontem apenas para os cândidos não significa que a
república siga viva para outros, mas sim que ela jamais existiu: até antes de
ontem – certamente até antes do último golpe, desferido em 2016 – a república
era nada mais que uma ilusão. A poesia de Jonnes, portanto, parte de uma visão
extremamente crítica, e parece operar a partir tanto dos limites das políticas
lulistas (sobretudo das suas repercussões para a vida das cidades nordestinas,
que não sofreram nenhum tipo de reforma urbana significativa[11])
quanto da reação encampada pela burguesia e por certos setores da classe média
com o golpe de 2016, a ofensiva neoliberal do governo Temer e a ascensão do
ideário bolsonarista de extrema-direita, muito amparada nas forças armadas
nacionais e regionais. Para além disso, no entanto, a poesia de Jonnes – e
desses outros poetas que citei anteriormente – parece se colocar em oposição à
própria ideologia do progresso e da tese desenvolvimentista e modernizadora como
método para a superação das questões sociais e culturais da região[12].
O crítico e professor Alfredo Bosi, nos seus
estudos sobre ideologia e contraideologia (e as formas como elas aparecem nas
obras literárias e poéticas), dedicou atenção especial ao que seria uma
ideologia do progresso e do desenvolvimento. Nestes estudos, deu destaque ao
pensamento e à atuação de Celso Furtado, autor que foi, segundo a leitura de
Bosi, paulatinamente desvendando e apontando para o caráter profundamente
ideológico da tese desenvolvimentista, afirmando, por exemplo, que “Em nenhum
campo dos estudos econômicos o embasamento ideológico é tão visível como na
chamada teoria do desenvolvimento. (...) O individualismo burguês teve aí uma
das suas expressões ideológicas mais sofisticadas e convincentes”. Bosi, ainda em
torno dessas ideias, se referiu à questão nordestina a partir da leitura da
obra de João Cabral. Numa entrevista, o crítico e professor paulistano afirmou
ser possível divisar, na poesia do pernambucano, "uma negação drástica ao
mito da urbanização do nordeste. Quando escreveu o poema 'O Rio' ou 'Morte e
Vida Severina", mostrou a situação estrutural do nordeste, como vítima do
desenvolvimento, assim como o fez Josué de Castro em 'Geografia da fome'. João
Cabral é contemporâneo da ideia de que aquela região estava mudando, a questão
estava apenas em o progresso chegar lá. Sua poesia, porém, no plano da imagem e
das figurações concretas, revela que esta miséria é um contraponto constante e
necessário do desenvolvimento. Ou seja: há necessidade daquela mão-de-obra
marginal, que será ocupada e substituída por outra em idênticas condições – é o
ciclo do caranguejo, o homem que come o caranguejo e depois é por ele comido.
Esta situação se repetirá, apesar ou por causa do desenvolvimento".
A bem da verdade, em 1972, ao publicar sua Crítica
à razão dualista, Chico de Oliveira, pensador muito próximo de Furtado, já
identificava a inevitável interdependência entre desenvolvimento e
subdesenvolvimento no modo como o capitalismo brasileiro se organizara ao longo
do século XX, criando uma espécie de simbiose entre setores modernos e
arcaicos, trabalho formal e informal etc. O subdesenvolvimento ou a
subcidadania não eram, portanto, falhas da engrenagem que a impediam de
funcionar plenamente, mas antes o seu modo de funcionar plenamente. Seis anos
depois, em 1978, Chico de Oliveira, ao depor na CPI sobre a SUDENE, abordaria a
questão nordestina criticando as repercussões do suposto milagre econômico
promovido pelos governos da ditadura militar, também amparados na ideia de
levar o progresso ou o desenvolvimento para a região. Segundo Chico, os métodos
desses governos partem de uma resolução que “mantém a pobreza, a reitera,
enquanto engalana as cidades com as lantejoulas do consumismo das novas classes
médias, enquanto as grandes empresas nacionais e internacionais engordam seus
lucros, num caso com a pobreza e os baixos salários do Nordeste (...)”. Logo em
seguida, o sociólogo faz a seguinte declaração: “Devo aqui, com a
responsabilidade que tenho principalmente por estar falando para o Congresso
Nacional, para sua Câmara dos Deputados, afirmar em alto e bom som que a
questão regional somente pode ser resolvida pelo socialismo”.
Uma visão radical e
socialista como essa de Chico de Oliveira pode ser identificada em grande parte
da poesia nordestina que lida com o lulismo, o ciclo mais recente de
desenvolvimento e modernização do Nordeste (no caso de Jonnes o socialismo
parece sustentado por visões anarquistas; em outros casos – como de Wollney –
por visões comunistas; Litrento, por sua vez, apresenta imagens como “tomando
caipirinha e discutindo o cenário/ de uma revolução de toda a américa latina”) –
ciclo cuja interrupção, diga-se, teve a questão setentrional como uma das suas
grandes disparadoras e um dos seus grandes campos de discussão, refletindo-se,
por exemplo, numa profusão de mapas eleitorais bicolores que serviam para
ilustrar um país regionalmente dividido (o que também acabou repercutindo de
forma pouco profunda no imaginário da esquerda brasileira, que, em muitos
casos, passou a tomar o Nordeste como um espaço quase mítico no qual o
reacionarismo não opera – ou opera de outro modo). Certa poesia, como a poesia
de Jonnes, tenta inquirir o lento e desmobilizador reformismo lulista, nos
termos de Singer, por meio da criação de imagens que ponham as suas
contradições em evidência (colocando sob questão o fundo ideológico que a tese
desenvolvimentista guarda, seja ela aplicada por correntes reformistas ou
conservadoras), muito embora a velocidade das reviravoltas reacionárias
brasileiras tenham levado o foco dos poetas – como é o caso do próprio Jonnes –
para a ascensão de uma extrema-direita bastante fundamentada no que se
convencionou chamar antipetismo.
No livro de Jonnes, o supermercado volta a surgir nos versos de “Os investidores estão tristes”, um poema irônico e bem-humorado que explora a ideia esotérica dos humores do mercado financeiro e a imagem de um Estado-babá, porém deslocando-o da relação ideológica tradicional (segundo a qual o Estado-babá dá suporte aos trabalhadores ou ao povo) e colocando às claras o fato de que ela, na verdade, se dá na relação entre Estado e burguesia – neste caso representada pelos investidores. Daí versos como “os investidores estão tristes/ os investidores estão esperneando/ os investidores esperneiam brabíssimos/ as autoridades do estado se afligem/ os investidores estão sentados/ a espernear no chão de um supermercado” ou ainda “e os investidores esbarram/ na gôndola de frios & laticínios/ e as autoridades agacham-se/ a recolher do chão os frios & laticínios/ antes que venham os repositores/ de gôndola para chama-los atenção/ pois os investidores/ não devem ser contrariados/ eles são sensíiiiiiiiiveis/ os investidores são sensíiiiiiiiveis/ os investidores/ inspiram cuidadosss”[13]. Certamente não é gratuito que o supermercado seja o cenário escolhido para esse poema que descreve a promiscuidade da relação entre setores financeiros e governamentais – uma escolha que ganha ainda mais vulto se retornamos às páginas anteriores, em que um hipermercado é saqueado e destruído pelo fogo. Há que se considerar, ao ver essas imagens criadas por Jonnes, que o supermercado é um espaço fundamental na sociedade brasileira atual, sendo sobretudo cenário de carestia e, por tabela, de atos cotidianos de furtos e da violência repressiva contra setores da população que enfrentam insegurança alimentar e fome – e aqui pode-se dizer que as suas construções, que para Milton Santos remetiam às catedrais (o que os tornava verdadeiros templos do consumo), tomam agora ares de fortalezas que resguardam os produtos para aqueles que podem ainda ter acesso a eles e tratam com violência desmedida os que tentam escapar à sua vigilância e à sua lógica (não por acaso o MLB – Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas – vem propondo e concretizando a ocupação de supermercados em diversas cidades do país).
Situada entre a imagem
do supermercado vista criticamente como um espaço de construção de cidadania
parcial e a imagem do supermercado vista ainda mais criticamente como um espaço
inacessível para certos setores da população, a poesia de Jonnes – e de outros
contemporâneos e conterrâneos seus – enfrenta o impasse com coragem, mas senso
de proporções também aguçados.
Há que se mencionar, aqui, após ler alguns versos de “Os investidores estão tristes”, o fato de que talvez o principal viés de ataque aos governos do PT e ao lulismo tenha sido a ideia de que se produzia no Brasil, por meio de um suposto excesso de políticas sociais (implantação de cotas, ampliação de crédito, Bolsa Família – tudo isso resultando num novo modo de circulação dos trabalhadores pela cidade e pelo país), um Estado paternalista que fazia caridade para o povo, de modo a, por tabela, controlar o seu voto. Esse tipo de leitura liberal e conservadora é que é desmontada pelo poeta – um poeta crítico aos traços ideológicos da tese desenvolvimentista, mas que, diante do desmonte das frágeis estruturas reformistas do lulismo, volta-se à ideia de insurreição: “Bem-aventurados os que escrevem com o fogo”, escreve Allan Jonnes a certa altura do poema “O festejo”, que encerra o livro com outras imagens em chamas e em conflito com a violência organizada do Estado, no qual escreve: “é noite de outubro em meu país// uma mulher saiu às ruas com um buquê/ de dinamites amparado na altura/ do rosto e dança contra o amontoado/ de corvos de uma guarda”. Em “O festejo”, lemos descrições incendiárias de enfrentamento direto e ouvimos o poeta louvar os métodos insidiosos da sabotagem. Jonnes, no entanto, parece consciente de que o que se escreve com fogo não são exatamente poemas, ao menos não são poemas como os que lemos em livros como o seu. Ele mesmo afirma, nuns versos em que escritores se reúnem num jantar, que o poema mais radical (um poema em que se dinamita a cabeça de policiais, ou um poema em que se joga ácido muriático em industriais, ou um poema em que se estoura boutiques – e, quem sabe, um poema em que se ateia fogo a um hipermercado?) “não te salvará de ser dócil”. Há aqui uma percepção da relação entre poesia e política que importa considerar, pois parece escapar da armadilha contemporânea segundo a qual pôr estas duas esferas em contato é necessariamente tornar-se panfletário e discursivo, virando o poeta uma espécie de ser engajado não na realidade, mas na exibição constante de uma politização que justifica a obra como uma espécie de coquetel molotov metafórico. Não é este o caso: em “O festejo”, o fogo dos coquetéis molotov e dos outros artefatos incendiários, na verdade, são meios utilizados para abrir caminho para o poema; ele escreve: “e por fim bem-aventurados/ os que mesmo no meio do pântano/ destes dias, com a lama alcançando/ já a altura do nosso desespero// vivem ainda de modo/ a deslocar-se no mundo/ para avançar na direção/ de coisas como poemas// e para reunir-se/ ao seu redor cada vez/ que alguém os diga/ numa rua numa praça/ ou numa escola/ em contra-ataque ao mundo”. Neste caminho é possível que haja supermercados ou hipermercados bloqueando a passagem. Será preciso saber lidar com esses obstáculos.
[1]
Algo
talvez semelhante ao que tentaria fazer Andy Warhol, elevando isso a outro
nível, com suas séries de reproduções de produtos como a Sopa Campbell, por
exemplo – que Peter Bürger, na sua Teoria da vanguarda, elege como o
ápice daquilo que Adorno chamava de “mimese do petrificado e do alienado”,
afirmando que “a reprodução de cem latas Campbell só inclui resistência contra
a sociedade de consumo para quem nelas queira ver tal resistência”, muito embora eu não ouse afirmar que Bürger tire todas as implicações possíveis do processo de Warhol.
[2] Embora esta não seja uma preocupação central do texto, devo esclarecer que se considera Nordeste, aqui (na esteira do próprio Furtado), um território cuja história e cuja realidade social atual possuem fundamentos econômicos e materiais específicos, baseados sobretudo numa economia extrativista e de exportação, amparada no latifúndio, no plantio da cana e no sistema escravocrata, principalmente ao longo da sua costa e nas suas áreas úmidas chamadas aqui e ali de Zona da Mata ou Recôncavo, e cuja expansão para o interior do continente fez das zonas secas, o Agreste e o Sertão, outros espaços importantes da sua organização socioespacial. Dito isto, dou como óbvio o fato de que há inúmeras singularidades estaduais, municipais etc. (bem como não ignoro que a atual configuração regional brasileira é bastante recente) – essas singularidades, no entanto, não impedem uma observação mais ampla e regional, entendendo ainda que a história da formação econômica e social dessa região se organiza também numa cultura muitas vezes encarada como singular no contexto nacional brasileiro, e quase sempre ciente de que ocupa, na hierarquia social (e não numa hierarquia meramente simbólica), um lugar de desprestígio associado justamente à pobreza, ao atraso técnico e intelectual e ao subdesenvolvimento, fruto de uma divisão nacional relativamente recente, apontada por Milton Santos nos seguintes termos: “(...), o espaço nacional fica dividido entre áreas onde os diversos aspectos da vida tendem a ser regidos pelos automatismos técnicos e sociais próprios à modernidade tecnicista e áreas onde esses nexos estão menos, ou quase nada, presentes. Seria uma oposição entre espaços inteligentes, racionais, e espaços opacos, não racionais ou incompletamente racionais, comandando uma nova divisão regional do país e determinando novas hierarquias: entre regiões com grande conteúdo em saber (nos objetos, nas instituições e empresas, nas pessoas) e regiões desprovidas dessa qualidade fundamental em nossa época; entre regiões do mandar e regiões do fazer”.
[3] Este é um frame do vídeo de
“História” feito pelo poeta e disponibilizado no Youtube. Aqui, o poema
completo: “"os estilhaços de eternit/ no rosto de uma criança/ saqueadores
de häagen-dazs/ em trajes de ginástica/ depositários loiros/ da moral punitivista/
estrando-se em ladrões/ insurgindo da fumaça preta/ como uma gangue de dublês/
carregados de gillete prestobarba// o gerente com um revólver/ ao redor dos
caixas eletrônicos/ e por sobre tudo um derrame/ três andares de fogo/ e de
entretenimento// no fim lembrarão apenas/ isto do namoro:// estiveram
abraçados/ e ao redor um grande evento/ a tudo saqueava, mudava/ terminava// se
forem alegóricos dirão:/ ao evento chamamos história./ se forem práticos, não
dirão nada." (JONES, 2021, pp. 13-14)
[4]
Anote-se,
de passagem, que o pensamento e atuação de Celso Furtado, bem como a criação da
SUDENE, foram importantes para a formulação de determinados aspectos da poética
de autores como João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar – de modo que a questão
setentrional, para além das leituras mais rasteiras sobre regionalismo,
atravessa a poesia nordestina há um longo tempo, influindo no seu modo de
fazer-se poema, ou seja, na conformação que propõe entre pensamento e
expressão, entre fundo e forma, apresentando modos mais ou menos eficazes de
pensar tanto a arte quanto a sociedade que a cria, apesar ou por causa das suas
configurações; como exemplo ligeiro, pense-se no modo como a literatura popular
– de viés oral – chegou à poesia tanto de Cabral, com sua obra-prima chamada Morte
e vida Severina, quanto de Gullar, cujas incursões na tradição cordelista
não foram propriamente bem-sucedidas, sendo mobilizadas, em ambos os casos,
para o debate de questões sociais da região como a seca, a migração, a
violência no campo etc.
[5] Gostaria de fazer aqui um desvio desse fluxo de análise para apontar para um fato, vindo também do campo cultural – no caso, das imagens do cinema documental – que me parece significativo neste debate: quando, em 2002, Eduardo Coutinho decide filmar o seu documentário Peões, que gira em torno das grandes greves dos operários do ABC (que, em seguida, culminariam na fundação do PT), ele inicia o seu filme empreendendo uma viagem ao Nordeste, uma viagem de retorno, buscando lá os peões de fábrica que, no ABC, começaram aquela movimentação, parecendo notar, também ele, a importância da questão setentrional, da questão nordestina, para a criação de um futuro distinto para um país que se preparava para eleger o primeiro presidente oriundo das classes trabalhadoras, também ele um nordestino imigrante.
[6] Altera-se também, é óbvio, os interesses e as funções sociais da literatura e da poesia, algo apontado por Bolaño por meio de uma ironia segundo a qual os escritores oriundos dessas classes populares procuravam apenas um meio de vida que os afastasse dos trabalhos braçais dos seus pais ou do cotidiano de horas laborais excessivas, bem como do desemprego – e para isso, segundo a ironia de Bolaño, estariam dispostos a qualquer negócio com o mercado literário tradicional. Bolaño, obviamente, não tinha em vista o movimento de acelerada democratização dos meios de produção editorial, que também viria a provocar certas alterações de paradigmas na poesia brasileira a partir da segunda década do século XXI. Não é mero acaso que todos os poetas aqui citados publiquem por casas editorais pequenas e artesanais, muitas vezes editando e negociando os seus próprios livros diretamente com os leitores. O campo editorial da poesia independente no Brasil, hoje, já tem a sua própria história e suas linhas de desenvolvimento, muitas delas passíveis de crítica e propostas de reformulação, sobretudo pelo fato de que, ao menos na minha leitura, temos ainda hoje uma quantidade reduzida de casas editoriais, sobretudo se comparada à quantidade de autores que emergiram e que buscam ser publicados, um cenário no qual surge o risco de que uma imensa profusão de poetas seja enquadrada num novo esquema bastante reduzido de produção e circulação editorial, aparecendo assim uma espécie de monopolismo independente, com selo underground mas atuação editorial e mercadológica tradicionais (e tradicional, no Brasil, quer dizer uma atuação irradiada a partir sobretudo do Sudeste). Contra isso, há que se saudar a atuação paciente e crítica de casas nordestinas como a Porta Aberta, a Paralelo13S, a Organismo, a Loitxa e outras mais.
[7] Vale mencionar, ainda, que neste mesmo texto (“Um olhar político – em defesa do partidarismo na arte”), a crítica argentina aponta para aquilo que seria o verdadeiro trabalho do olhar político: “Ante a especialização da cultura (compartimentos de vanguarda e compartimentos populares, ambos espreitados pelo mercado), o olhar político provará um sistema de redes (que não deveriam levar apenas à fórmula estética tradicional, e sem dúvida produtiva, de populismo mais vanguarda). O olhar político organiza conceitual e criticamente; põe em contato, traça paralelos entre questões que, do ponto de vista social e programático, não necessariamente se encontrariam. Tais redes, qualquer que seja o seu sentido, não são um novo sistema de hierarquias mas antes um espaço de máxima visibilidade das diferenças, orientado não apenas para a mudança mas também interessado na democratização das instituições culturais” – de modo que esse olhar, hoje, e no Nordeste brasileiro, não pode confundir a crítica com o estabelecimento de hierarquias e nem a superação das hierarquias com o abandono do exercício crítico, sobretudo num contexto de ataque às culturas das classes trabalhadoras da região por vias diretas e indiretas: abandonar a crítica seria, neste caso, abrir caminho para a assimilação dos padrões estéticos do mercado e da ideologia dominante (que não carrega esse adjetivo por acaso: quem vacila, cai – ainda que fazendo festa ou comemorando uma vitória ilusória ou meramente simbólica). Urgente mesmo, mais do que fazer arte populista, é não perder de vista aquilo com o que Sarlo encerra o seu texto: a democratização radical das instituições culturais (a poesia é uma delas, mas também o são as universidades, os meios editorais, os suplementos literários etc.).
[8] Milton Santos já dizia que “As classes médias amolecidas deixam absorver-se pela cultura de massa e dela retiram argumento para racionalizar sua existência empobrecida”, apontando para um movimento que talvez esteja hoje em seu momento mais agudo no Brasil e no Nordeste.
[9] Em “Carnaval na cidade grande”, o
potiguar Pedro Lucas Bezerra chega a uma imagem fantasiosa que pode tanto ser
irônica quanto utópica: “Quando choveu em pleno Carnaval/ parecia que só nós
éramos invasores/ ou que nunca tivemos genocidas/ nunca vimos os adversários”.
Aproveitando os cenários de festas populares, vale mencionar também o poema “Os
olhos de Adélia naquela ladeira”, de Maíra Dal’Maz: “era são joão perto do
campus/ Adélia olhava com visgo pra frente/ seu cigarro amarelando os dedos/ no
meio do escarcéu quadriculado de pessoas que sequer sabem de onde vinha todo o
milho caro que enganavam os pós-modernos” (imagens pouco festivas do São João
também marcam o segundo livro da poeta alagoana Natália Agra, o Noite de São
João, no qual a celebração é sobretudo um rito de morte e de perda).
[10] Muito do que se discute aqui foi encarado
– obviamente em outros termos, a partir de outras experiências e outros
contextos – pelo poeta Pier Paolo Pasolini a partir do final da década de 1960,
momento em que, segundo a sua visão, a Itália era tomada por uma cultura do
consumo que uniformizava o país, procurando apagar as distinções regionais e de
classe (a isso ele chamava de verdadeiro fascismo). O mito
desenvolvimentista ou progressista, o consumismo, a tristeza hedonista da
juventude, a ascensão da classe média e dos seus valores (morais, estéticos,
éticos etc.) tomados como modelo ideal a partir do qual se passava a organizar a
sociedade italiana foram questões com as quais Pasolini se bateu
cotidianamente. Reunidos sobretudo no volume Escritos corsários, esses
textos foram alvos de polêmicas amplas (e talvez ainda não resolvidas) em seu
país. Embora a questão dialetal na Itália se coloque num nível que não ocorre
no Brasil, vale pensar numa formulação de Pasolini segundo a qual “Uma das
características principais dessa igualdade nas manifestações vitais” era a “fossilização
da linguagem verbal (os estudantes falam como livros impressos, os rapazes do
povo perderam a habilidade de inventar gírias)” – por “igualdade nas
manifestações vitais” Pasolini entendia justamente a tendência “progressista”
de superar supostos “atrasos” sociais italianos resultando em “homens” que “são
conformistas e todos iguais uns aos outros segundo um código interclassista
(estudante igual a operário, operário do norte igual a operário do sul) – pelo
menos potencialmente, na ansiosa vontade de se uniformizarem”. No Nordeste,
hoje, a questão também se coloca, embora em outros termos, visto que o que
prevaleceu, na construção da identidade regional, foi a opção pelo popular,
mais do que pela classe média – em verdade, é esta que parece ter necessidade
de operar uma uniformização simbólica pela via da linguagem e da arte associando-se
às classes proletárias e subproletárias, porém mantendo a sua distinção no que
diz respeito ao uso dos espaços da cidade e sem jamais questionar o controle
dos setores da indústria cultural local comandada pelas burguesias regionais –
donas de bandas, de festas, de camarotes, de veículos de mídia, de partes da
cidade etc (essa movimentação pode ser ilustrada com um fato feirense: por muito
tempo, um dos símbolos do atraso da cidade foi a presença de cavalos nas suas
regiões centrais, usados sobretudo na lida dos carroceiros; hoje, reduzido
drasticamente o número desses animais puxando carroças de trabalhadores,
cresceu, por outro lado, a quantidade de cavalos utilizados em passeios por
parte das classes médias e altas da cidade que procuram exibir sua suposta relação
com a vida e a cultura do campo, as vaquejadas etc); contudo, voltando às
questões linguísticas e artísticas, penso que os artistas nordestinos hoje
lidam com o risco do uso do dialeto tornar-se mera “cor local” ou participar,
acriticamente, dessa simulação promovida pelas classes médias e altas das suas
cidades, realizando simples acenos pouco simpáticos aos leitores de fora do
Nordeste – mas talvez um dos modos de fuga dessa cilada possa ser divisado nos
exemplos aqui tratados, em que os estudantes e os rapazes do povo
aos quais Pasolini se referia são menos dois atores sociais em busca de uma
linguagem única e mais um único ator evitando falar como livros impressos
e tentando talvez o inverso, que os livros impressos soem mais como a fala.
[11] As capitais, bem como as cidades grandes do agreste nordestino, são os centros gravitacionais em torno dos quais essa poesia gira, encontrando aí, certamente, seu principal foco de resistência e de atrito com as políticas lulistas. Para além dos já citados Wollney e Jonnes, vale mencionar os trajetos de Maria Dolores Rodriguez entre Feira de Santana e Salvador, atenta ao poder policial, aos desastres urbanos tornados naturais (como os deslizamentos de encostas na capital baiana) e à degradação da memória popular causada por uma modernização de viés a um só tempo destruidor e conservador; no seu livro Procurem Luisa no Mercado de Arte Popular, a morte da mãe é descrita e enfrentada em paralelo ao encolhimento do espaço público e popular, aqui situado no Mercado de Arte Popular de Feira de Santana, onde essa mãe trabalhava e convivia com “os violeiros, sanfoneiros, cordelistas, repentistas” bem como “as feirantes e os feirantes que entravam ali para vender frutas, hortaliças, verduras”, dando novas cores ao que talvez seja o conflito mais antigo da cidade: a superação da sua condição de cidade-feira para a sua transformação numa cidade-supermercado ou numa cidade-shopping; é daí, então, que parecem surgir versos como “sempre que venho/ a Feira de Santana/ penso: nunca mais vou voltar/ aqui/ (...)/ impossível sonhar/ em um lugar/ onde uma mãe não/ habita mais”. E se é impossível sonhar em Feira, os pesadelos talvez sejam o principal motor da poesia de Maíra Dal’Maz no seu livro Agouro, repleto de imagens de mau agouro (o livro se abre pedindo: “façam silêncio:/ a frequência do rádio levará minhas terríveis preces/ para o algoz do bicho inchado de chumbinho” e termina afirmando que “os urubus rondam/ o cão sem plumas”) e de registros de pesadelos que envolvem demissões, brigas com a mãe, apocalipses, punições ao gozo feminino, violência gratuita e “facções de cyberpunk em Muriú” que levam um filho indesejado “(...) de bicicleta a ser salvo/ nunca soube andar de bicicleta/ mas eu me salvo/ já ele está com ranho na cara inteira/ ao lado de um homem com a braguilha aberta/ choro muito e quero morrer”.
[12] A essa altura, espero já ter
deixado claro o fato de que não encaro a poesia aqui em questão como um dado
cultural decorrente do lulismo no sentido de ser a sua expressão no campo da
cultura ou da poesia (fenômeno que certamente existe, ainda que não de forma
organizada, mas que tende a ser de pouco interesse artístico). Evidenciar a tensão
existente entre as políticas lulistas e essa poesia é apenas uma consequência
da noção de que as relações entre ideologia, sociedade, cultura e arte
raramente se dão de forma direta, automática ou instantânea (qual o tempo da
poesia, afinal?). Recentemente, os efeitos do lulismo na cultura brasileira vêm
sendo lidos pelo filósofo Vladimir Safatle numa chave negativa, já que, segundo
ele, “pela primeira vez na história brasileira, um ciclo de crescimento
econômico não foi acompanhado de explosão criativa cultural. Contrariamente ao
que ocorreu nos anos 30, 50 e mesmo nos anos 70, o Brasil não conheceu na
última década uma fase de explosão criativa na qual sua sociedade usa as artes
e a cultura para experimentar novas formas. Talvez porque ele não foi capaz de
escapar de seu mito do desenvolvimento econômico”; as reflexões de Safatle
partem sobretudo (ou exclusivamente?) de uma análise da música popular brasileira,
e, até aqui, não foram devidamente desenvolvidas pelo filósofo, mas guardam
possibilidades de grande interesse, que me provocam algumas perguntas: se
ciclos de crescimento econômico resultam em ondas de explosão criativa
cultural, é justo dizer que há uma relação direta entre as duas coisas (e, se
há, de onde deve partir uma crítica ao mito desenvolvimentista?)? além disso, a
visão de Safatle pode ser aplicada a setores altamente dependentes de
investimentos públicos como o cinema (que, aliás, viveu uma fase de grande
força justamente durante a vigência do lulismo) ou para outros espaços
diminutos da indústria cultural como a poesia? e, por fim, a explosão criativa
se daria de forma instantânea, ainda mais se se considera que ela deve resultar
da fuga do mito que abre espaço para a sua existência?
[13] A tristeza, que vem pela via da ironia quando identificada nos investidores, é parte central do livro de Jonnes que, em “Retrato para depois daqui”, escreve: "um poema que me parecesse/ com aquele dia em que você bateu/ extraordinária em minha casa/ no meio da manhã/ para perguntar se eu sabia/ qual o número em nossa época/ era maior que o número/ de desempregados// (...)// e continuou que aqueles dias/ umas notícias davam que maior/ que o número de desempregados/ em nossa época era só o número/ de pessoas infelizes com emprego”. O estado depressivo ou deprimido dos trabalhadores está presente em todo o livro: na insônia, nos primeiros passos das crianças, nas noites violentas, nas conversas entre casais, nas propostas de uma poética etc. Pedro Lucas Bezerra, por sua vez, escreve: “O Brasil é o país mais deprimido da América Latina/ é por isso que aqui jamais prosperou o cinema de ação” – e me parece justo afirmar que o noir nordestino de Jonnes realmente passa longe do cinema de ação, inclusive porque “aqui, nesse estilhaço de américa do sul/ não há os anti-heróis do scorcese/ para livrar da vertigem as semipúberes/ e elas oferecem o mel na boca dos/ turistas por detrás da rua dos hotéis”.
[14] Vale lembrar também do ministro
Paulo Guedes afirmando, em 2021, que ao entrar em supermercados ouvia
agradecimentos das pessoas; e, em 2022, pedindo aos empresários da área que
adiem os reajustes de preços para o ano seguinte. No poema de outro sergipano
da mesma geração, Pedro Bomba, poema intitulado simplesmente “Supermercados”,
acompanhamos um tom de crescente tensão a partir do acirramento justamente da
fome e da iminência do momento dos saques: "(...) é/ sabido, para essas
pessoas, que quando o desespero/ desmoronar nos ombros do povo e a criança
nascida,/ chorar incansavelmente por comida, é sabido que serão/ os
supermercados os primeiros a serem saqueados e,/ assim, retomado o direito à
barriga cheia que eu sei,/ você também sabe, aquela pessoa que passou também/
sabe, que tudo isso dito agora, pode acontecer a/ qualquer momento".
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