Como se sabe, o "encontro literário" é um tópico fundamental da obra de Roberto Bolaño: oficinas de poesia, lançamentos de livros, aulas em universidades, eventos e feiras literárias - todos estes espaços, e todos eles cheios de escritores e leitores, estão espalhados pelos seus poemas, pelos seus contos e pelos seus romances. Há desde representações amenas desses lugares, como se fossem espaços onde "talentos" e "potenciais" se confirmassem, e mesmo onde a camaradagem se sobrepusesse a questões de "qualidade" literária ou poética (com Os detetives selvagens sendo o caso mais nítido dessa faceta, livro onde é inegável o tom de que dar grandes rolês é mais importante do que criar grandes obras), até - e aqui é onde a coisa se intensifica e se amplifica - a descrição desses ambientes literários como verdadeiros campos minados, nos quais, mais do que uma proposta de comunidade, prevaleceria um ambiente para a disseminação de padrões com base em hierarquias e preconceitos de todos os tipos (o padrão literário, aqui, seria apenas um passo inicial: ensinar a escrever um conto, um poema ou até mesmo um diário, como hoje se pretende, às vezes parece um expediente através do qual se divisa algo tanto de uma ideia de literatura e criação quanto de uma pedagogia como entradas em ou domínios de um modelo - qual modelo?). O caso extremo, acho, são os romances pequenos, o Noturno do Chile e o Estrela distante, nos quais Bolaño insere a violência da tortura e do desaparecimento nas tertúlias e nas oficinas literárias, com o exemplo lapidar do poeta de vanguarda torturador que desaparece com alguns dos seus companheiros de oficina de poesia em Concepción - uma oficina ministrada no âmbito da universidade, por professores-poetas. No entanto, mesmo Os detetives selvagens, em certa medida, acena com essa visão menos edulcorada e otimista do saber literário como forma de compartilhamento de experiências de criação - basta ver as marcas claras de classismo, sexismo ou, menos importantes, as picuinhas que os rapazes deviam resolver no soco. Mas a obra de Bolaño é rica demais, e não acho que haja, nela, qualquer visão definitiva a respeito de qualquer coisa - aliás, só uma: a literatura é sempre violenta.